Editorial | 13 de Mar de 2018 - 04h03

Mitos sobre Aracaju

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Não tem jeito! Todos os anos, no aniversário de Aracaju, no dia 17 de março, várias versões falsas sobre a história da cidade dominam a imprensa local. Essa data também é o momento de as autoridades enaltecerem a capital de Sergipe baseando-se em slogans ultrapassados e que não mais se adéquam à realidade aracajuana. Haja mitos!
O mais absurdo é o que afirma que a capital nasceu na Colina do Santo Antônio. Inácio Barbosa, então presidente da província de Sergipe, que transferiu a capital de São Cristóvão para Aracaju em 1855, deve-se remoer na cova toda a vez que ouve as TVs locais dizerem isso, com direito a repórter escovada fazendo passagem em frente à igreja do santo casamenteiro, perpetuando a mentira todos os anos. Uma grande “fake news”, só para usar o termo da moda!
Ora, basta usar a cabeça para perceber a grande falta de lógica dessa afirmação. Inácio Barbosa transferiu a capital porque queria que a nova sede do governo sergipano ficasse próxima ao mar, num porto por onde seria mais fácil escoar a produção de açúcar do Estado. Para que ele ia então fundar a nova cidade no topo de uma colina longe da praia? Aracaju nasceu no Centro, entre as praças General Valadão e Fausto Cardoso, e não no Santo Antônio. O plano original da cidade, planejado por Sebastião Pirro, previa 32 quadras entrecortadas por ruas sempre em ângulos retos a cada 110 metros, o famoso tabuleiro de xadrez, ou quadrado de Pirro. Outro mito é o de dizer que a cidade foi a primeira capital planejada do Brasil. Nunca foi! Teresina, capital do Piauí, detém esse título, pois é dois anos mais velha que Aracaju. 
O que existia na área do Santo Antônio e atual Bairro Industrial era uma vila de pescadores, mas essa não foi a cidade fundada em 1855. Outra mentira é a que diz que a igreja da colina foi a primeira da cidade. Não é! O primeiro templo católico de Aracaju foi a Igreja de São Salvador, localizada na esquina dos calçadões da João Pessoa e Laranjeiras. Ela também serviu como catedral até a construção da Catedral Metropolitana, já no início do século XX. A Igreja do Santo Antônio também só começou a ser construída no século passado.
Outro mito que a imprensa sustenta é o dos bairros inexistentes. Não é raro vê-la dizer “no Bairro Garcia”, ou “no Bairro Veneza”. Essas localidades não são reconhecidas oficialmente como bairros pela Prefeitura de Aracaju. Uma simples olhada numa planta da capital bastaria para evitar esse erro. O Garcia é um loteamento criado na década de 1980 no então bairro Grageru. Com o surgimento do Bairro Jardins, no final da década de 1990, essa área foi a ele incorporada. O Loteamento Veneza era uma invasão, que depois foi regularizada, na saída da cidade, e faz parte do Bairro Olaria. Também é errado falar “conjunto Bugio”, o nome do conjunto é Assis Chateaubriand, Bugio é o bairro em que ele está localizado, logo só existe Bairro Bugio.
Mas o maior mito de Aracaju foi o de que ela seria a “capital da qualidade de vida”. Há uma década, um estudo do Ministério da Saúde avaliou hábitos considerados saudáveis em diversas capitais brasileiras. Aracaju se saiu muito bem no ranking elaborado nessa época, pois foi a cidade com menor número de fumantes e a em que os moradores eram menos sedentários. Só isso!
No entanto, a Prefeitura, naquele momento, tomou esse slogan para si e o usou como se os hábitos saudáveis da população tivessem alguma relação com as realizações da administração. Esse mesmo slogan foi reciclado pelo governo municipal atual. Ora, basta uma passadinha na UPA Nestor Piva, na Avenida Maranhão, para ver a qualidade do atendimento médico, o que derruba qualquer frase autoelogiosa.
Alías, levando-se em conta dados do 11o Anuário Brasileiro da Segurança Pública, Aracaju é a capital mais violenta do país, quando se considera o número de homicídios: 66,7 mortes por 100 mil habitantes, com um total de 428 crimes em 2016, uma alta de 18,6% em comparação com 2015 (os dados de 2017 ainda serão divulgados neste ano). Há qualidade de vida onde se mata tanto?