Editorial | 08 de Jan de 2018 - 10h01

Aracaju não tem alma praieira

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Quando Aracaju foi fundada, em 1855, o governador da então província de Sergipe, Inácio Barbosa, queria que ela ficasse perto do mar, para servir de porto para escoar a produção açucareira. O principal núcleo urbano da nova capital foi erguido, contudo, junto ao Rio Sergipe. Foi somente na década de 1960, quase cem anos depois, que a cidade finalmente encontrou o Oceano Atlântico, quando a atual região da Praia da Atalaia começou a ser povoada.
Esse desenvolvimento tardio próximo da praia pode ajudar a explicar por que Aracaju, embora tenha um belo litoral, não possa ser considerada, de fato, uma cidade praieira. A vida urbana da cidade nunca girou em torno do mar. Ele ficou longe, quase inacessível durante anos. Aqui não havia o hábito de curtir uma praia num fim de tarde pós-trabalho ou de incorporar o banho de mar na rotina diária, como na Zona Sul do Rio de Janeiro, por exemplo.
Ir à praia sempre foi um evento em Aracaju. Coisa de combinar com antecedência e reunir a família. A praia na capital sergipana era para ser curtida em coletivo, não individualmente. A aparente distância da Atalaia fez com que ela começasse a ser ocupada por sítios e casas de veraneio. Ir até lá era sinônimo de dia de folga, de férias, de temporadas. Não havia um contato diário com o mar.
Esse distanciamento do mar pode ajudar a explicar certas atitudes atuais do aracajuano. Apesar de ser o lazer mais democrático, frequentar as praias com melhor estrutura na cidade é um ato elitista. Os melhores bares ficam na Sarney, longe, e oferecem amenidades pagas. Quem não tem dinheiro não vai até lá. Até mesmo na Atalaia, quem quiser desfrutar do pouco conforto na faixa de areia também terá que pôr a mão no bolso (como bem atesta a reportagem especial do Sergipe Agora desta semana).
O Estado nunca procurou olhar para as praias como espaços de lazer de todos. A Orla, apesar de bela, também não se agrega com o mar, que fica longe, afastado pela grande faixa de areia. Não há equipamentos públicos nela. A distância física colaborou para a de atitude dos governantes.
Nem a recente expansão da cidade em direção à Zona de Expansão contribui para que Aracaju se tornasse mais praieira. Quem vive em condomínios fechados na Melício Machado, além de estar relativamente longe da praia, precisa se deslocar até ela de carro, e ainda se relaciona mais com o núcleo urbano central que o perto da praia.
Essa singularidade faz a cidade ter uma relação quase turística com a praia e o mar. É que nem ir à piscina na casa de um amigo. Você sabe que ela sempre estará lá, mas não se sente dono dela, perto dela, e nem a torna parte de sua rotina. Aracaju tem praia sim, mas não tem alma praieira.