Pirro | 24 de Jan de 2018 - 11h01

Choque de Realidade

Gleisi.jpg

Destempero de Gleisi mostra PT menor


No início da tarde da quarta-feira, 24, assim que o desembargador Gelbran Neto, relator do recurso de Lula no Tribunal Regional Federal da 4a região (TRF4) em Porto Alegre, proferiu o seu voto mantendo a condenação de primeira instância do ex-presidente, e elevando a pena dada a ele pelo juiz Sérgio Moro de 9,5 anos para 12 anos e um mês, a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, subiu o tom do destempero que já fazia parte de suas declarações dias antes do julgamento.
Na semana anterior, a senadora havia dito que “para prender Lula, vai ter que matar gente”, em clara alusão à violência. Mesmo que tenha sido por mera força de retórica, ela perdeu a compostura; ontem, assim que o relator votou, ela disse que “era hora de radicalizar”, isso significa: perpetuar as narrativas falsas que têm sido a tônica do PT desde que surgiram as denúncias contra o ex-presidente. O que Gleise, e boa parte do Partido dos Trabalhadores, parece ignorar é que, ao defender Lula abusando da realidade, a sigla corre o risco de perder ainda mais relevância.
O acórdão do TRF4 condenando Lula em definitivo por unanimidade foi duro e feito sob medida para rebater as narrativas falsas. A principal delas é que “não há provas”. Por mais admiração que se tenha pelo ex-presidente, não há como negar que provas existem, tanto que foram citadas à exaustão pelos magistrados de Porto Alegre. Um deles, o desembargador Leandro Paulsen, revisor do caso, chegou a elencar especificamente 19 elementos probatórios.
Até a defesa de Lula entrou no clima de claque do partido. A estratégia de desqualificar a ação como perseguição política cai por terra quando outros réus petistas ligados à mesma ação foram absolvidos. Lula mesmo também foi inocentado da acusação de ter os bens adquiridos durante a Presidência mantidos num depósito pela construtora OAS, a mesma do tríplex, o que configuraria favorecimento ilícito.
Por ter sido uma decisão unânime, o único recurso cabível pela defesa de Lula são os embargos de declaração, que não mudam o mérito, ou seja, não há chance de ele ser inocentado. Ao ex-presidente, agora, só resta protelar o julgamento dos recursos no TRF4 ou Superior Tribunal de Justiça (STJ) para tentar forçar o registro da candidatura em agosto, algo difícil, pois os prazos são rígidos e a tramitação rápida. Isso sem contar com o Tribunal Superior Eleitoral, que, sem dúvida, não autorizará o registro. Ou seja, Lula, dificilmente, será candidato, porque não tem mais chance de ser inocentado. Mas esse fato não interessa ao PT.
Assim que saiu a confirmação da condenação, o partido (leia-se Gleisi) emitiu uma nota em que culpa a Rede Globo pela “perseguição a Lula” e insinua até manipulação do juízo em Porto Alegre. Por mais que essa conversa energize a militância, quem acusa tem que provar. O partido perde as estribeiras e zomba das instituições. Quer defender Lula? O PT tem todo direito de fazer isso, mas dentro do que possa ser considerado republicano e coerente, não destempero para animar torcida.
Começa agora a segunda narrativa falsa desse caso, e essa é ainda mais absurda, para não dizer irônica: a de que deixar Lula fora da eleição é “golpe”.  Ora, mas o próprio PT foi defensor da Lei de Ficha Limpa, aprovada por unanimidade no Congresso, e promulgada pelo próprio Lula em 2010. A Lei é clara: réu condenado por órgão colegiado (caso do TRF4) não pode ser candidato. PT diz que tirar Lula da eleição é contra a democracia. E desrespeitar a Ficha Limpa é o quê? O partido diz tanto defender os valores democráticos, mas parece jogar tudo para cima quando se sente incomodado por eles. Ah, e o Ministério Público paulista começou a apurar os crimes relacionados ao tríplex em 2014, após desconfiar da transferência das obras do prédio da Bancoop para a OAS, portanto, nessa época, nem Dilma tinha sido reeleita, logo, esse papo de que tudo foi armado para tirar Lula da corrida eleitoral não cola.
O partido parece não ter aprendido com seus erros. Desde o mensalão, vários políticos petistas defendem uma nova fundação da sigla, a retomada dos compromissos éticos, a aceitação de culpas. Os gaúchos Tasso Genro, Olívio Dutra e até o senador pernambucano Humberto Costa fazem parte da ala mais moderada do PT, que busca tal reflexão sobre a mudança de imagem. Infelizmente, são solenemente ignorados dentro do partido. Até porque admitir erros nessa altura seria trair o próprio discurso de Lula e soar como admissão de culpa.
Nesse contexto, restou ao partido ser mero exército de defesa do ex-presidente. Requentaram-se velhos discursos da década de 1980, como o das “elites contra nós”. Isso só ainda seduz a militância mais xiita, afinal, quem pediu e recebeu propina da Obebrecht, OAS, Camargo Correia, beneficiou a Oi, Portugal Telecom, Eike Batista, Bumlai e JBS não pode se dizer inimigo das “elites”.
O PT é imprescindível ao sistema democrático brasileiro, afinal toda democracia tem que ter diferentes esferas ideológicas representadas e atuantes. Além disso, o partido conseguiu chegar ao poder levado pela esperança popular de dias melhores, governou por 13 anos, conseguiu êxitos na área social, porém nunca soube lidar com seus erros. Como uma criança birrenta, culpa os outros pelo que fez de errado, inventa histórias, faz-se de vítima e ignora a renovação do processo político. Pelo visto, a sigla não aprendeu nada desde a acachapante derrota nas urnas nas eleições municipais de 2016. O eleitor, ainda mais em tempo de escândalos de corrupção diários, quer propostas, não mais ouvir discurso velho de “eles contra nós”! O Partido dos Trabalhadores precisa espernear menos e deitar mais no divã!
 
E em Sergipe?
 
A condenação de Lula pouco altera a situação do PT local. Desde a morte do ex-governador Marcelo Déda, em 2013, o partido não disputa eleições como cabeça de chapa. O máximo que conseguiu, desde então, foi tentar emplacar o ex-deputado federal Rogério Carvalho como senador em 2014 (ele acabou derrotado). Em 2016, obteve êxito com a candidatura de Eliane Aquino, viúva de Déda, como vice na chapa do prefeito de Aracaju, Edvaldo Nogueira (PC do B).
Já neste ano, o partido deverá seguir o mesmo caminho: não terá candidatos a cargos majoritários como cabeça de chapa. A melhor aposta do partido continua sendo Eliane, que pode ser vice de Belivaldo Chagas (MDB). Há quem sugira que ela deva ir para a Assembleia. Rogério Carvalho pode tentar uma nova candidatura ao Senado.
De certo é que falta ao PT local um nome de peso que aglutine todos os grupos de conflito interno e seja consenso para disputar um cargo com uma candidatura “puro sangue”. O trabalho de grande articulador era de Déda, mas ninguém o herdou. Eliane tem carisma e é uma chamadora de votos por causa do legado do marido, mas ainda sofre resistência dentro do próprio PT. Se ganhar para deputada, pode quebrar essa barreira e iniciar um processo importante, e mais do que necessário, para a renovação do partido em Sergipe.
 
Até que teve efeito
 
Na semana passada, a coluna Pirro abordou a visita da presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, a Sergipe. No texto, foi dito que a vinda dela ao estado foi inócua, visto que ela podia muito bem saber da realidade local de haver muitos presos provisórios com um simples telefonema. Porém, a presença de Carmen parece ter tirado a Secretaria da Justiça (Sejuc) do marasmo, e, também na semana passada, finalmente, o Governo do Estado anunciou a construção do novo presídio de Areia Branca, que irá fazer com que Sergipe volte a ter casa de detenção destinada ao regime semiaberto. A nova unidade terá espaço para 390 detentos do sexo masculino e as obras deverão começar ainda neste semestre.